Nos últimos meses, muito se falou sobre direitos autorais na Internet, principalmente, por causa dos projetos de lei americanos SOPA (Stop Online Piracy Act) e PIPA (Protect IP Act). Os projetos pretendiam que os detentores de propriedade intelectual tivessem mais forças para combater a pirataria na rede mundial de computadores. Os defensores das leis acreditam que essa proteção aos criadores irá impulsionar a industria de mídia, gerando maiores receitas e mais empregos.

Entretanto, o que se viu na internet foram manifestações que envolveram diversas esferas: governos, empresas, sites, blogs e milhões de usuários furiosos. Todos contra os projetos de lei dos EUA. O medo dos manifestantes é de que os instrumentos do SOPA prejudiquem a liberdade de expressão e difusão de conhecimento proporcionada pela rede. Então, cidadãos de toda a aldeia global se mobilizaram para assinar uma petição online contra os  dois projetos. Além disso, repúdio e promessas de boicote aos financiadores emergiam a todo tempo nas redes sociais (veja um dos casos na figura a baixo).

Infográfico da Furgaldad mostra o que fez o GoDaddy desistir do SOPA.

Os protestos surtiram efeito. Diversos senadores americanos anunciaram publicamente que não compartilhavam mais com as idéias da censura. Empresas também recuaram. E, logo, o projeto de lei foi proibido de ser votado no congresso dos EUA pelo próprio Barack Obama. Até o blog oficial da Casa Branca se retratou.

Pois bem, parecia que o assunto "censura" estava encerrado, certo? Errado. A sopa de letrinhas do direito autoral na internet, acaba de ganhar um novo ingrediente com sabor bem brasileiro: o ECAD. 

Para quem não conhece, ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) é uma espécie de sindicato dos compositores. É o órgão nacional responsável pela arrecadação ($$$$$$$$...) e distribuição ($) dos direitos autorais das músicas aos autores. A rádio que você ouve e o show que você vai,  por exemplo, pagam uma taxa para o ECAD por cada música executada. Depois, parte desse valor pago é repassado para os compositores.

"Tá bom, mas o que o ECAD tem a ver com censura na internet?" Da mesma forma que o ECAD cobra a rádio pelas músicas executadas, ele está passando a cobrar a também na internet. Quem não pagar pode ir parar na justiça. Um dos alvos do órgão é o próprio YouTube. 

"Ah, entendi. Então o ECAD vai tirar o YouTube do ar? Isso é um absurdo!" Se você é um YouTubespectador, pode ficar tranquilo. O ECAD e o YouTube já entraram em acordo desde setembro de 2010. O Google paga, mensalmente, para o ECAD um valor (não divulgado) baseado na receita do YouTube no Brasil.

"UFA! O YouTube já está pagando a conta. Está tudo tranquilo". Mais ou menos... Se você tem um blog ou um site, as coisas não estão tão tranquilas assim. Não se sabe bem quando, mas o ECAD passou a monitorar e cobrar sites e blogs que embedam músicas oriundas de serviços online como YouTube, Vimeo ou 4shared. Na última quarta-feira (07/03/2012), estourou na mídia o caso da cobrança do blog Caligrafitti, porém eu já venho acompanhando blogueiros alertarem sobre e-mails do ECAD desde o mês passado. A notícia ainda não tinha saído na mídia, pois muita gente não estava acreditando que o alerta era real. Havia a desconfiança de que era algum tipo de golpe novo na praça. Quem iria imaginar que seria cobrado por colocar vídeos do YouTube no blog?

Leoni pergunta: "Por que cobrar de novo?" Fonte: O Globo


"Mas isso não faz sentido! Você não acabou de dizer que o YouTube já paga para o ECAD? Isso é dupla cobrança. É ilegal!" As palavras que vou dizer agora são as mais tristes da curta história desse blog (então, prepare o coração): não, não é ilegal! Triste, né? Pois é. O Ecad está amparado pela lei, como mostra trechos da reportagem do G1:

"De acordo com o artigo 31 da Lei 9.610/98, as diversas modalidades de utilização da música são independentes entre si, e a autorização para o uso por uma delas não se estende para as demais"

Continua parecendo um absurdo, mas é a lei. Assim como você, eu também não estava convencido até saber sobre a briga judicial entre o ECAD e os hotéis de Porto Alegre (está sentado? se você ainda não caiu para trás, vai cair agora). Em maio de 2011, o STJ (Supremo Tribunal de Justiça) entendeu que os hotéis de Porto Alegre deveriam pagar uma taxa mensal ao ECAD, por causa da execução de música nos hotéis, já que os quartos possuem (pasmem) rádios ou TVs. Quando eu li essa notícia, na hora, eu imaginei alguém "vestido de ECAD", com uma espada de esgrima na mão, falando: "Touchê!". 

A rádio paga ao ECAD pela execução das músicas. O hotel que executa as músicas da rádio (já pagas) também é cobrado pelo ECAD. Resumindo tudo: é como se o YouTube fosse a rádio, e nossos blogs e sites fossem os hotéis. Simples assim.

"Mas o meu blog não é um "hotel", meu blog é um "albergue". Vou ter que pagar também?" É triste, mas, pelas notícias iniciais, a resposta é sim. Seu blog pode ser a Casa da Mãe Joana, ou seja, todo mundo entra, sai, não paga nada, e você também não recebe nada por isso, mas para o ECAD você vai ter que pagar. Segundo matéria do jornal O Globo, o ECAD já possui 1.170 sites classificados em "grande, médio e pequeno porte" e os valores cobrados são "sempre proporcionais ao porte e características de cada utilização". 

Não se sabe muito sobre os preços. O valor que vi divulgado, até agora, é de R$ 352,59 para sites pessoais de pequeno porte, como foi o caso do blog Caligrafitti. No site do ECAD, fala um pouco sobre a classificação dos sites (aqui), porém não encontrei os preços lá. Como a tecnologia do ECAD ainda não permite saber quantas pessoas ouviram a música no seu site, esse valor cobrado corresponde a uma taxa fixa mensal. Portanto, você não vai pagar pelo número de músicas ou execuções.

"Como faço para não pagar essa taxa?" Antes de tudo, talvez você não esteja no cadastro do ECAD. Mas não se sabe por quanto tempo você ficará livre. Então, se não quiser contar com a sorte, existem três alternativas:
  1. Não colocar vídeos embedados no seu site/blog: Eu sei que essa opção é óbvia, mas é uma solução. 

  2. Colocar apenas o link da música: Segundo nota do ECAD, o link para o usuário acessar o vídeo no próprio youtube, pode. Para ficar mais sofisticado, você pode utilizar a imagem abaixo:

  3. Solicitar permissão PRÉVIA para o ECAD: É possível solicitar ao ECAD uma autorização prévia para execução pública de alguma música. Não sei se eles conseguirão atender a demanda de blogueiros de todo o Brasil, mas você pode tentar. Você encontra p endereço do escritório do ECAD na sua cidade aqui.
Por fim, só queria concluir esse post com uma reflexão. Passei a minha vida toda ouvindo a seguinte frase: "a legislação brasileira é uma das mais avançadas do mundo, só não é cumprida". Mas não é que é verdade? O projeto SOPA chegaria para votação no congresso americano apenas agora em 2012. Mas os legisladores brasileiros já tinham "pensando" em censura parecida há muito tempo: a lei 9.610/98 foi votada e decretada muito antes dos projetos americanos. Olhando por essa ótica, realmente estamos à frente.

2 Responses so far.

  1. Samantha says:

    Mas e se você tem um vídeo autoral e a música que usa é estrangeira? O artista estrangeiro não faz parte do sindicato dos compositores brasileiros e portanto o ECAD não poderia cobrar, só uma cobrança vinda do exterior seria válida não é?!E segundo alguns advogados a cobrança é ilegal sim, o ECAD já está sendo processado por várias pessoas por cobrança.

  2. Unknown says:

    Acredito que no caso de músicas estrangeiras, o ECAD não cobre nada. Mas é só uma suposição, pois não sou estudante de Direito. Vou perguntar sobre isso para alguns advogados. =D

    Quanto a legalidade da cobrança, eu estou apenas repassando informação que li de alguns advogados em um forum na web e também o que saiu na mídia. Porém, sei que já existem advogados tentando recorrer. O próprio blog citado no texto disse que iria "comprar briga".

    Vamos ver no que vai dar. Minha torcida é pelos blogs. =D

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